O gerente-geral da farmacêutica Pfizer na América Latina, Carlos Murillo, confirmou em seu depoimento aos senadores da CPI da Covid que o governo de Jair Bolsonaro rejeitou três ofertas de 70 milhões de doses da vacina Pfizer/BioNTech, cujas primeiras doses poderiam ter sido entregues em dezembro de 2020.
Segundo o executivo, que era presidente da Pfizer no Brasil em 2020, a primeira oferta de 70 milhões de doses, em 14 agosto, tinha prazo para resposta de 15 dias — governo ignorou o prazo e a oferta expirou.
O gerente-geral da farmacêutica Pfizer na América Latina, Carlos Murillo
A segunda e terceira ofertas de 70 milhões de doses foram feitas em 18 e 26 de agosto, e também não foram aceitas pelo governo, segundo Carlos Murillo.
Todas as ofertas tinham cronograma de início da entrega em 2020. A terceira oferta, em 26 de agosto, previa a entrega de 1,5 milhão de doses ainda em dezembro do ano passado e mais 3 milhões no primeiro trimestre de 2021 — o resto seria entregue ao longo do ano.
Segundo Murillo, não houve atrasos até agora no cronograma de entrega da empresa — ou seja, se o governo tivesse aceito alguma das propostas, as primeiras vacinas da Pfizer teriam chegado ao Brasil ainda em dezembro de 2020 e a vacinação poderia ter sido iniciada com um pedido de aprovação da Anvisa para uso emergencial do imunizante.
Foi isso que aconteceu com a Coronavac, do Instituto Butantan, contratada pelo governo de São Paulo antes da aprovação da agência. A vacinação começou em 17 de janeiro, dia em que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) concedeu autorização de uso emergencial à Coronavac.
Em fevereiro, a Anvisa deu aprovação definitiva para a vacina da Pfizer, um dos primeiros países do mundo a fazê-lo. Mas o contrato com a empresa só foi fechado em março e a primeira remessa de cerca de um milhão de doses da vacina da Pfizer/BioNTech chegou ao Brasil no final do último mês de abril.
Murillo afirmou à CPI que os outros países fecharam o contrato de compra antes da aprovação das agências regulatórias. Nos EUA, a vacinação começou em 14 de dezembro de 2020 com aprovação emergencial pela FDA, a agência regulatória americana.
Fechamento do contrato e preços
Segundo Murillo, em novembro o governo brasileiro afirmou que o contrato só poderia ser feito após a aprovação da Anvisa, portanto novas ofertas só foram feitas em 2021, depois que a agência regulatória deu seu parecer positivo para a vacina da Pfizer.
O contato do governo federal com a empresa só foi fechado em 8 março, quando a pandemia atingia pico no Brasil e o número de mortos por covid-19 chegava a 400 mil.
O contrato fechado prevê 100 milhões de doses. O primeiro lote com um milhão chegou em abril e outras 14 milhões de doses serão entregues no segundo trimestre.
A política de preços da empresa, disse o executivo, contempla três níveis diferentes para três tipos de países: nações com renda alta, média e baixa. O Brasil se situaria entre as nações com renda média e o preço ofertado sempre foi de 10 dólares por dose.
O executivo também afirmou que todos os países foram procurados pela Pfizer ao mesmo momento.
Carta a Bolsonaro e envolvimento de Wajngarten
Murillo também confirmou que a empresa enviou uma carta ao presidente Jair Bolsonaro assinada pelo presidente global da empresa no final do ano passado. O objetivo era tentar fazer com que as negociações avançassem.
O documento mencionava as três ofertas feitas em agosto e a intenção da empresa de avançar as negociações com o Brasil. Segundo Murillo, essa carta não foi respondida nem pelo presidente nem pelo ministério da Saúde.
"Não recebemos resposta da presidência", disse Murillo.
Cláusulas 'leoninas' e dificuldades da negociação
Questionado sobre as dificuldades na negociação com o ministério da Saúde, Murillo afirmou que inicialmente "os temas complexos da negociação" eram relacionados à questão logística.
"O ministério tinha preocupação porque nossa vacina requer um armazenamento de -70º C e isso era uma preocupação. Mas em novembro apresentamos uma caixa de armazenamento que era um avanço da ciência que permitia manter a temperatura apenas com gelo seco", disse.
Em seguida, afirmou, as preocupações do ministério se tornaram outras duas questões, disse Murillo.
"Uma era o registro da Anvisa e a segunda era uma autorização legislativa específica para atender as condições contratuais", isso foi objeto das negociações entre dezembro e fevereiro.
Carlos Murillo afirmou que não é verdade a informação passada pelo ministro da saúde Eduardo Pazuello ao senado, em fevereiro, de que a Pfizer tinha oferecido apenas 6 milhões de doses.
O executivo disse novamente que as ofertas da Pfizer ao governo brasileiro foram de 70 milhões de doses, e não de 6 milhões, e declarou não concordar com o posicionamento de Pazuello de que as condições contratuais eram "leoninas".
"As condições que oferecemos para o Brasil são exatamente as mesmas que a Pfizer negociou com 110 países no mundo."
"Nesse pandemia a Pfizer correu um risco sem precedente e exigiu a todos os países as mesmas condições que exigiu para o Brasil."
Com informação da BBC Brasil
Fotos: Divulgação
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