Em Madri, na Espanha, uma orquestra formada apenas por instrumentos feitos a partir de materiais reciclados se tornou um lugar de acolhimento e oportunidade para 102 crianças e adolescentes, de 5 nacionalidades, que, juntando música, reciclagem e superação, já se apresentaram até no Teatro Real, uma das principais instituições culturais espanholas.
Materiais reaproveitados dão vida à projeto que atende mais de 100 jovens em situação de vulnerabilidade social. Foto:divulgação
O projeto “La musica del reciclaje” oferece aulas em 4 centros sociais e 2 escolas públicas de Madrid onde são recebidos meninos e meninas de 7 a 20 anos.
Cada lugar reúne crianças e adolescentes com características distintas. Mas eles possuem algo em comum. Todos que participam da aula estão, de alguma forma, em uma situação de vulnerabilidade.
Alguns possuem uma situação familiar complicada ou seus pais perderam a custódia deles nos tribunais. Outros são ciganos ou imigrantes, jovens que muitas vezes enfrentam dificuldades financeiras para sobreviver na capital europeia.
Bolsas para estudos de música
Desde que o projeto começou, em 2014, alguns alunos conseguiram bolsas e estão seguindo os estudos no Conservatório e na Escola de Música Criativa, uma escola privada de Educação Musical.
Embora essa ainda não seja a realidade de todos os integrantes do projeto, Cristina conta que a maioria deles gostaria de poder se dedicar profissionalmente à música, seja fazendo parte de um grupo musical ou dando aulas, como é o caso da violoncelista que está na iniciativa social desde o começo e hoje ensina os mais jovens a tocar o violoncelo.
Fernando Solar, o alaúde do projeto, que é o principal responsável pela fabricação dos instrumentos, afirma que, quando tudo começou, sua oficina rapidamente se transformou no local mais limpo do bairro. Isso porque os vizinhos iam até lá para deixar latas, caixas, pedaços de madeira, e tudo o mais que eles achavam que poderia ser usado para fazer um instrumento.
Ideias e reutilização
Mas nem todos os materiais são doados. Às vezes o alaúde encontra inspiração para as suas criações dentro da própria casa, em algum objeto que ele iria jogar fora, mas logo percebe que poderia ganhar um novo uso. É o caso do gongo do projeto, feito a partir de uma velha panela de cozinhar paella, prato típico da Espanha.
Na importante função de alaúde, de vez em quando Fernando conta com a ajuda de alguns alunos que se interessam não só por tocar os instrumentos, mas também por confeccioná-los. Sob a batuta do mestre, podem descobrir mais um talento e mais uma oportunidade de profissão.
Sobre a reutilização dos materiais nessa pequena, porém significativa linha de produção, Cristina diz que gosta de pensar que a iniciativa inspira outras pessoas, que passam a perceber que vale a pena dar segundas oportunidades.
“É um projeto que fala de segundas chances tanto para pessoas quanto para objetos. A reciclagem é sobre segundas vidas e valorizamos que nem as pessoas e nem os resíduos sejam descartáveis”, afirma ela.
Jovens ensaiam com instrumentos feitos a partir de materiais reciclados: gongo feito a partir da panela de paella e tambores confeccionados com latas de lixo e folhas de raio-x. — Foto: Divulgação
A orquestra
A orquestra “Musica del reciclaje” conta com seis professores que dão aulas de violino, flauta, percussão, saxofone, violão e violoncelo.
Vítor Gil, que além de ensinar violoncelo também dirige os jovens músicos, conta que o projeto foi uma descoberta que superou tudo o que ele esperava. Lá descobriu diversos talentos, encontrou muita energia e vontade de aprender e afirma que hoje os meninos e meninas da orquestra já são uma parte inseparável da sua vida.
Gil lembra com carinho da apresentação no Teatro Real, em 2019, pouco antes da pandemia de Covid. Para ele, foi aí que a orquestra se tornou adulta do ponto de vista musical, pois conseguiu fazer uma apresentação brilhante e, ainda por cima, dividiu o palco com Sara Baras, uma das maiores dançarinas de flamenco da Espanha.
“Foi emocionante, exigiu toda a concentração e habilidade técnica deles e o resultado foi excelente: a satisfação de crescer como orquestra e como músicos”, comentou.
Com informação do Um só planeta
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